domingo, 12 de fevereiro de 2012

Surf Jamaica - Dreadlocks no campeonato mundial


Com um envelope grande nas mãos, Billy desce a escada que liga sua casa ao surf club. Quer mostrar à reportagem um projeto no qual trabalha há algum tempo. De dentro do envelope, retira um livro com uma capa dura branca coberta por uma foto instigante: um surfista com largos dreadlocks passando com sua prancha em frente a uma gigantesca plantação de maconha – a foto só não está nesta página porque Billy não liberou, aliás. Sobre a imagem, a inscrição em letras douradas: Surf rasta – A história não contada do surf, style e música jamaicana de 1960 a 2010. Nas páginas internas, retratos antigos ilustram como os amantes de Jah começaram a encarar as ondas.


Pelos cálculos de billy, hoje na Jamaica há menos de 200 surfistas, profissionais ou não. Mulheres, não chegam a dez
Em parceria com a marca de surf australiana Insight, que patrocina a família Wilmot, Billy pretende lançar o livro no ano que vem. “A ideia é ilustrar o desenvolvimento do surf jamaicano, mostrando o que acontecia ao mesmo tempo na música e na cultura rasta. Nos anos 70 e 80 o país ganhou nome por conta do reggae e dos rastafáris, mas ninguém sabe que, paralelamente, o surf também se desenvolvia.” Para os filhos de Billy, o reggae, a vida rasta e o surf caminham juntos, numa combinação que, quem tem o privilégio de usufruir diz ser a mais prazerosa possível. Inilek Wilmot, 24 anos, por exemplo, pegou as primeiras ondas aos 7, já identificado com o lifestyle rastafári – o que, em seu caso, não inclui o baseado, por causa da asma.


Aqui vale uma breve explicação: na cultura rasta, fumar a ganja é uma espécie de ritual religioso, uma oferenda a Jah. A maioria dos rastas que ouvimos classifica sua cultura não como uma religião, mas como um estilo de vida, marcado por uma ligação estreita com a natureza (ponto que o aproxima do surf) e pela crença de que as relações humanas são mais importantes que qualquer bem material. O discurso sobre viver da forma mais natural possível está na ponta da língua de todos que ostentam dreadlocks. O cabelo, por sinal, também tem explicação religiosa. “Eles crescem de acordo com um voto, um agradecimeto a Deus por algo. Pode ser um voto de três anos ou uma semana.”


Dos nove campeonatos nacionais realizados no país, Inilek venceu quatro. Outros familiares levaram mais alguns, consolidando uma hegemonia dos rasta surfers. Seu irmão Icah planeja inclusive entrar para o circuito do WQS (World Qualifing Series) em 2010. Tudo isso sem ganhar um centavo em premiações. “Não tem dinheiro. É só pra dizer: ‘Eu fiz, sou o campeão nacional’.”, explica Inilek. A maior recompensa é mesmo a participação no ISA World Surfing Games – competição mundial da respeitada International Surfing Association. Desde 2002, os melhores surfistas da temporada vão ao torneio. Bons resultados eles nunca conseguiram, mas ninguém se preocupa com isso. Garantem que, mesmo sem estar entre os top, são idolatrados no evento.

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